segunda-feira, 30 de abril de 2007

"Sussurros do céu, choros da terra"

Céu cinzento, repleto de brumas, eis um dia chuvoso,
uma boa oportunidade de ficar em casa, refugiado.
Isso, porém, é para poucos: o homem-máquina não o pode,
tem que estar na rua, trabalhando, mesmo com o céu caindo,
em busca do seu salario, do seu existir, do seu viver.

Eu, na minha condição de burguês, desfruto do calor do lar,
aproveito para escutar um samba antigo e ler um bom livro.
Enquanto escrevo essas linhas, olhando lágrimas caírem,
lembro-me do meu amor, distante de mim, tão longe,
e com esse distanciar, ponho-me a tremer de frio.

Escuto lá fora ruídos da cidade, que se move sem parar,
mesmo com rios a se formar pelas suas ruas e avenidas,
mesmo com homens a gritar ao verem seus barracos sumirem
em meio a um mar de lama e agora repousarem de baixo do morro.
A cidade não para, sempre há engrenagens para substituir
[as desgastadas.

Se essa mesma tempestade caísse no sertão, seria diferente,
com as primeiras gotas, os sabiás se colocariam a cantar,
anunciando boas novas: a chegada da nova estação, da esperança.
É na cidade, contudo, que ela se esgota, se espreme,
assim como essas linhas, e caem, caem pesadas no asfalto frio.

Um dia chuvoso, parece ser um simples desabar de pingos,
mas envolve uma multiplicidade de existências, afeta a tudo
[e a todos.
Faz-me lembrar a falta do calor de seu seio, faz-me rir e chorar,
nas batidas de um samba e nas batidas das estacas,
marcadas a suor e sangue das formiguinhas-operários, lá em baixo.

Um comentário:

Anônimo disse...

depois da tempestestade,outra
quão degradante é sentir-se peça de quebra-cabeças feitos para não se encaixarem!
o fascínio das engrenagens que parecem funcionar...e insistimos em fingir acreditar!
oh, não!são jogos infindos num ir e vir de imagens e palavras vazias ou quiçá cheias de um sentido que não deveriam possuir. sim, incorrer constantemente em ledos enganos ou, ainda que não completamente submersos, deitar no leito que Procustos sucessivos recorrentemente nos preparam
Qual o porquê de fatidicamente o simples implicar provincianismo?
Em que sentido caminhar ou traçar estradas quando as margens são inevitavelmente delineadas por espectros de invertade que talvez nós mesmos tenhamos criado?
o propósito de permanecer na fantasia, no torpor da alienação é esconder a dor ou reproduzi-la egoisticamente?
As urtigas da mentira brotam e ardem àquelas almas que teimam em arrancá-las."plantem suas flores, protejam-se em egos!"
ah,modernidade retrógrada... gerações de falaciosos ou de silentes reprodutores de discurso.
de onde nascem idéias, devem florescer sentimentos.talvez.
ou, contrariamente, mascarem vazios tendentes a inutilmente serem preenchidos pela fluidez do que se engole sem mastigar.
o desespero por vezes conduz à autopiedade, mas a anuência leva à letargia.
o que esperar do ser? Ser,simplesmente?Não, tolice, existir não poderia ser simplório ao ponto de transparecer a espontaneidade dos sentidos. Absolutamente, vamos dançar num bal masque sem fim nem propósito.
Transformar sentimento em mediocridade e crianças e velhos em néscios que não sabem fingir o que não são. Quiçá ser não passe "ser o que não se é", e atentantiva interminável de vir-a-ser-o-que-nunca-se-será ocupe suficientemente o tempo e a mente daqueles que poderiam, de fato, fazer de suas existências(?) algo que valesse a pena.
Mas, sim, não se tem tempo. olha a vida passar pela janela, Carolina!
Carolina não viu;estava preocupada em assistir à novela. ou em chorar suas mágoas e frustações. Mas, se ela olhasse, o que veria?
às vezes temo a falta de algo a perceber. qualquer coisa de novo ou que sempre esteve ali, a despeito de nunca termos nos dado conta.
ainda vejo crianças sorrindo e sonhando despretenciosamente. Ou pretensamente planejando algo sublevando os obstáculos ou não encarando seu porvir como tais.
preciso de esperança. precisamos de fé em algo que nos mantenha de sentidos despertos...

Sonhar fatiga quando precisamos cerrar os olhos para tanto.

"Vargas suicidou-se; Nietzsche enlouqueceu"... curioso.