sexta-feira, 25 de julho de 2008

O porque do canto do sabiá nunca se calar


Por mais que eu pense e insista em suprimi-las,
idéias não me fogem à mente.
Elas relutam em permanecer, resistem!
Não adianta joga-las ao vazio, já que ficam
e aparecem a cada momento de vacilo.

Idéias tais não me deixam cair no desespero,
não me deixam fugir da realidade,
tiram-me do alto das torres de marfim.
Chamam-me a toda hora para o mundo em que estou,
prendem-me à realidade a qual me rodeia,
trazem para meu ser as aflições alheias,
nao tão alheias assim a minha pessoa
como querem que eu pense,
de modo que é impossivel negar:

Elas são intinsecas a sentimentos,
intimamente ligadas aos sentir o mundo,
a tentativa de desvela-lo, descobri-lo.

(...)

Porém, não se engane,
você que tenta navegar por esses mares sem fim,
com suas ondas furiosas e ventos uivantes
do viver e tentar conhecer o mundo,
o silêncio muitas vezes comunica mais
que dezenas de palavras,
já que nele se dissolvem, em desordem,
uma confusão de sentimentos e vivências.

Crônica sobre o choro de um bebê aos berros

O choro de um bebê pode-nos mostrar, muitas vezes, a aflição, sofrimento e angustia de um ser humano, em toda sua humanidade (ainda nascente), ainda não reprimida pelas convenções e padrões sociais, tão próximo daqueles seres humanos em seus momentos de desespero extremo diante de sua existência. A cada berro seu, um berro longo e profundo, é um palpitar de sofrimento, vindo de suas entranhas. Assim, o choro de um bebê mostra sua aclamação pela libertação de sua situação que o oprime, a qual lhe incomoda, seja esta situação o estranhar do ambiente novo que ocupa, seja uma mão que tenta calar-lhe a boca.

Todos nós que nos dispomos a expelir o que refletimos sobre o mundo, em parte praticamos este grito, este choro, ao nos entregarmos nessas linhas, deixando aqui pairar nossas angustias, sentimentos. Não devemos nos acanhar, ficarmos presos, reprimidos, em escrever, expelir, essas idéias, no meio de cinco ou seis pessoas nos olhando, em meio a um lugar público, repleto de pudores. Temos que perder nosso pudor próprio, não temer nossos sentimentos, temos que ter um choro semelhante ao bebê que não tem medo de expressar seu sofrimento a cada berro seu mais profundo. Cada linha desta crônica e de outras deve ser um berro nosso.

Este mesmo berro, expressão de ânsia por se libertar de algo que tanto oprime, também não pode ser esquecido por aqueles e aquelas que são reduzidos/as a condições de existência subumanas, que apenas sobre-vivem, que a cada dia algo limita-lhes a possibilidade de realizar-se enquanto seres humanos/as, reconhecerem-se como homens e mulheres, como a sua própria maneira de viver-existir. Não devem deixar que calem suas vozes, seus choros, que convenções e padrões sociais, privilégios concentrados a poucos, reprimam-lhes sua ânsia por liberdade, liberdade esta só possível com existência em dignidade de toda uma coletividade. Sim, não se deve deixar a mecanização da vida cotidiana, a reificação dos homens e mulheres (estas caladas em sua voz também ao serem escondidas atrás dos homens e toda uma linguagem em plural no masculino que engloba o feminino) em desejos artificiais de consumo, cale as expressões por um existir mais humano, para isso todas as armas valem: pedras, poesia, noites.

Assim como um bebê não deixa que sua mãe, envergonhada por seu filho chamar a atenção de todos e todas com seu choro, cale seus berros, escancarando o que sente, sua profunda dor, os sujeitos em sua situação de marginalizados devem voltar a seu espírito de recém-nascidos, não temendo pudores que os adultos detem. Nisso também se insere poetas ao não se acanhar diante do que lhe aguça a sua sensibilidade, seus sentimentos.

Bebês, não deixem esses adultos caretas silenciar-te. Resistam, chorem!